A rosa é linda, mas você esqueceu que ela tem espinhos. Eu posso ver o sangue escorrendo por entre seus dedos e a dor estampada no seu olhar e no sorriso sem graça. A rosa tem espinhos, mas sente o perfume dela. Você não encontra perfume igual em nenhuma das outras rosas, cada uma tem o seu, como as impressões digitais dos dedos dos humanos, dos lábios que beijam outros lábios, e que talvez por isso quase nunca se encaixem, é preciso muito amor.
No momento exato da dor mais escandalosa possível, a alma se decomporá e nada irá aliviar os calafrios. A dormência seria o mais essencial, mas falhou dessa vez. Reza-se pelo encontro das almas amadas e amantes que se perderam no mundo e passaram a vida inteira encontrando um motivo plausível para pararem de procurar umas as outras, elas não sossegam, elas não conseguem. Estão sempre aflitas em busca do que nunca viu, da que nunca viu, mas que bem sabem que é a metade que lhe completa. Então junta tudo em uma só estrofe: As almas, a dor e a dormência que nem existe mais.
Os dias vão passando como quando mudam as estações, todos fingem que vêem, mas na verdade estão todos tão desinteressados com o mundo que nem percebem quando o dia vira noite e quando a tal alma tão procurada passa pelo outro lado da rua olhando para cima esperando uma luz esperançosa e suficiente para fazer desistir agora. É preciso arregalar os olhos para não perder nenhum movimento.
A falta de atenção, a complexidade dos fatos tão lícitos e limpos diante do mar, e mais ainda quando joga tudo para o alto e faz do dia um dia sujo cheio de cheiros ilícitos e nada que os faça parar. Não param. É como se o mundo fosse seu, como se você estivesse manipulando cada um com cordinhas. Nem o vento consegue derrubar a cinza do cigarro, nem a maresia consegue tirar o balançar dos cabelos, nem a noite consegue tirar a vista do mar. A natureza é linda, mas até então não tem conseguido ser mais forte que a poesia que está dentro daquelas pessoas.
É como se o mundo fosse de fato seu e você tivesse medo de tê-lo. É como se o mundo estivesse pesando em suas costas e você não conseguisse mais andar, como se estivesse em suas mãos e você não conseguisse carregar. O peso do mundo muito além de uma folha de jornal, muito além das metas que cada um traçou, muito além das idéias que não foram expostas ainda e pelo tempo não serão mais e se forem, não farão mais sentido algum.
No momento exato da displicência com o coração, no momento na qual mais faltou com cuidado com as forças, com o resto das forças que foi guardando para quando não mais tivesse o que fazer, a casa caiu. Caiu porque uma das almas resolveu ir embora de vez e deixou uma carta que dizia coisas que doíam no coração, doíam na alma. Sabe-se lá qual era o destinatário que estava escrito, mas carta e receptor se encontraram e a alma foi se desmantelando como criança se desmantela em prantos quando sente fome, a alma foi se espalhando pelo chão.
Foi espalhando e foi se transformando em lágrimas e essas lágrimas foram regando as raízes daquele roseiral, aquele tão quieto e sorridente fincado no meio do nada. Aquele que você foi lá arrancar um pedaço dele, arrancar a rosa mais alta, mais vermelha, mais bonita, mais cheia de espinhos. Depois de ter para si a rosa mais linda, reclama do sangue sujo que escorre e mistura nas lágrimas que ainda nem secaram de vez. Você não tem jeito mesmo, vai fazer das próximas rosas, rosas bonitas, vermelhas, brilhantes, perfumadas, espinhadas e sujas. Sujas como o seu sangue sujo.
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