quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Contando-lhe em fatias


Eu passo a noite inteira te seguindo com o olhar, por achar que para qualquer lugar que você vá será sempre longe demais, e fico cada vez mais atenciosa, sem pestanejar e sem nenhuma lágrima cair. Fixação, está sempre longe demais.
Na cadeira ao lado, na rua ao lado, na cidade ao lado, sempre ao lado, na minha frente, dentro do meu coração, não, não está mais tão longe demais. Mas eu vejo, eu presto atenção em cada passo, cada riso, cada abraço, eu preciso. Um tempo, um pedaço de afeição jogado na minha cara, uma maneira de ir embora sem ficar. Qualquer maneira para que eu consiga ir embora sem ficar.
Quero passar milhões de noites te perdendo em meus braços, te prendendo em meus laços, velando o seu sono, o suor que em ti escorre, o cinismo no sorriso mais singelo de criança, nas manias amáveis, quero amar seu penteado, sua maneira de falar, de admitir certas coisas e principalmente de negar.
Está na hora de parar de fingir que eu não te amo.
Olha, quando eu esbarrei contigo e derrubei sem querer o licor de menta que estava tirando o seu juízo do lugar e toquei seu ombro para pedir perdão, eu não vi mais nada e nem ninguém além de nós dois, depois de poucos segundos - que mais me pareciam a eternidade - eu vi meu coração cair no chão e toda aquela multidão pisoteá-lo, perto do fim da festa eu o reencontrei. Bem no meio do salão, – não, ninguém se importou - estraçalhado, aos pedaços, completamente moído. Acendi meu cigarro com um isqueiro bonito e que tinha a chama verde e curta, ardeu meus olhos. Uma ardência que doía a alma, como quando eu vi de longe meu primeiro amor partir, sem nem deixar rastros – eu lembro muito bem, eu tinha quatorze anos hahaha Mas foi. - Peguei o coração com uma das mãos e não sabia mais o que fazer com ele, restos mortais de um coração vazio. O salão ainda estava cheio de gente, o calor humano já estava tirando o fôlego. Fui para o bar, o maior e com menos gente junta, no primeiro andar. No bar de cima tinha um cinzeiro charmoso, eu deveria ser só mais uma garota confusa usufruindo do vidro bem polido, tentando transformar tristeza em cinzas. Posicionei o cigarro no cinzeiro e pedi mais uma taça, - com duas cerejas desta vez – pensei, bebi, pensei, bebi, bebi, bebi, pensei e você esbarrou em mim sem querer, e derrubou o resto de Martini que ainda deixava cheiro na minha taça e passou a deixar cheiro no meu decote. E de tanto medo que deixasse deslizar e perdesse meu coração de uma vez por todas, eu o segurei como não pensei que poderia e você falou – dando-me um guardanapo encontrado por ali - “Perdão...”, eu respondi com um sorriso sem graça e raivoso, mas quando encarei seus olhos castanhos que mais pareciam o anoitecer mais lindo, eu percebi que tudo o que eu não queria perder estava ali, diante de mim.
E desde então eu quero te trazer mais para perto antes que o futuro tão incerto afogue meus não dias e meses do calendário, lendário calendário sem datas, sem dias, sem feriados, sem nada, lendário calendário vazio, tão vazio quanto o coração citado lá no início. Eu quero poder nunca te perder de vista, nem te perder de qualquer maneira que se pense, que se possa, que se tenha e da maneira mais difícil, da maneira que não tenha. Eu não quero ter-te construído em projeção em meu sonho, quero tocar você enquanto ainda estiver deitado no lado esquerdo da cama e ter certeza que quando eu acordar pela manhã com o sol na minha cara você ainda vai estar lá, e vai passar a ficar lá com freqüência, por desejo próprio, por querer ficar, por não querer mais ir. Quero saber mais sobre seus desejos, ambições, vontades, até onde você consegue chegar com toda essa lábia. Quero saber se você tem medo do escuro, se tem medo do absurdo, da força surda, se tem medo do que não pode ver, de magia, de candomblé, de gente viva ou de gente morta. Quero saber sobre o cheiro que não larga seus lençóis quando você acorda, se ele também vai impregnar nos meus, nos nossos. Saber sobre o tempo perdido, sobre tantas coisas mais.
Tem poucos anos de idade quando compara com o mundo, é menino, bem menino, nem sabe ainda o que é amar. Tem medo - na verdade - de ser fraco demais para isso, mas rapaz, a vida é complicada e não podemos desviar das coisas boas por ter medo das conseqüências, a gente aprende a amar e a sobreviver simultaneamente. Eu estou aprendendo, e você ainda nem entrou em meu quarto.
E eu prefiro te ter mais perto, te ver mais perto, mas não mais te ver enlaçando os dedos em outros dedos mais frios, nem quero te sentir tão perto com um cheiro de perfume que não é meu, eu não quero mais te ver beijando outras bocas infames, abraçando um espaço cheio de nada, que no dia seguinte nem saberá onde encontrou e nem qual nome ganhou quando nasceu. Eu quero te tirar do abismo emocional, te mostrar que a vida é muito além de momentos que nunca deixarão saudades, valiosas saudades, das mais plausíveis saudades.
Ainda quero te ter por perto, mas não mais tão perto a ponto de ter que suportar ao reparar seus olhos encarando outros olhos vis e que também não sabem amar. Quero te ter mais perto quando você também quiser ficar mais perto de mim, respirar comigo, ficar comigo até sabe-se lá quando.
A vida é engraçada mesmo, vai e volta e sempre esquece as lembranças na minha porta.
Mas se você quiser entrar, eu faço questão, será sempre bem vindo, meu amor.

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