segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

  Parece que me estudaram por um tempo e criaram você para mim. E eu me sinto uma cobra, me sinto um escarro purulento de um prisioneiro qualquer.
  Todas as noites antes de dormir eu espero você jogar uma pedrinha na minha janela até que crie coragem para bater na minha porta da frente. Todas as noites antes de dormir eu penso um pouco em você, um pouco depois de acordar e muito durante o resto do dia.
  Quem não se apaixonaria por alguém como você? Pela sua voz, sua cicatriz, seus desenhos.
A primeira vez que eu te vi eu fiquei alguns segundos olhando para você sem que você nem percebesse. Fingi que não tinha te visto, sentei ao seu lado, fingi não perceber. Esbarrei em você, fingi ser sem querer, me desculpei e saí. Todas as demais vezes que eu te vi era como se fosse a primeira vez, eu fingia não te conhecer, fingia que era sem querer, mas na verdade eu só queria um pouco da sua atenção. E você me dava, o pior de tudo é que você me dava, cada dia um pouco mais. Aí eu não quis mais, eu fingi que você é um filme que ninguém quer ver e fui me afastando cada dia um pouco mais.     Até que você nunca mais apareceu, e eu resolvi te procurar. Até que te encontrei e resolvi me desviar. E desviei, e passei a ocupar a mente com outros problemas, outras coisas, outras idéias, outras pessoas. Ocupei a mente com tanta coisa para substituir o seu vazio, mas não foi o suficiente, nada foi suficiente. Eu te encontrei de novo, caindo nos meus braços, segurando a minha mão, olhando para mim. Eu tentei de novo, eu tentei fingir que não te conhecia, fingir que não te queria e fingir que foi tudo sem querer, mas na verdade eu não queria ficar longe, não queria me afastar de novo, te perder de vista, te perder na vida, te perder.
  É que às vezes você me olha de um jeito e sorri que parece que você consegue ver dentro de mim, além de mim. E há vezes que parece que o seu sorriso vai me abraçar, e me aquecer, e me ninar, e me guardar.
  E parece que sua voz vai me carregar para um lugar bem distante, talvez uma praia bem longe, um lugar onde só caibamos nós dois. E a gente vai ficar lá, até amanhecer milhões de vezes, contando grãos de areia e repartindo carinhos, carícias, abraços, sei lá.
  Às vezes eu acho que você não precisa de muita coisa para chegar à perfeição, noutras acho que já chegou e noutras ainda acho que mal te conheço. Embora eu te veja bem dentro de ti, além de ti.
  E me agrada esse seu jeito ingênuo, seu jeito sem graça, sua timidez, sua falta de sorte.
  As coincidências da vida, suas perguntas sem nexo, sua cara de assustado, sua vontade de me surpreender, de me convidar para sentar, de puxar assunto, de me olhar, de me deixar te olhar enquanto você me olha e me deixar pensar no que será que você está pensando por não dizer nada.
  Essa vida se mostra cada vez mais filhadaputa.

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