terça-feira, 6 de maio de 2008

E então, o que você diria?

- O amor não existe. É isso o que estou tentando lhe dizer.
- [Então o que você me diz das noites que lhe vi chorar aos pés da cama, jurando que ele ia voltar um dia? Então, se o amor não existe, qual o propósito da vida? Das manhãs que acordamos felizes e principalmente das manhãs que acordamos morrendo de vontade de nunca ter acordado?
"Deitar e morrer", foi esse o seu pedido de Natal, você lembra? Eu lembro, você falou tão baixo, tão baixo, mais baixo que o mais silencioso dos sussurros, mas eu ouvi, era tão nova, inocente, e não sabia o que você queria dizer com aquilo, agora eu sei. Você desejava não amá-lo, não esperá-lo voltar nunca mais. Se o amor não existe, porque você não me deixa ir embora agora? Talvez porque você saiba que não vou conseguir sozinha, sem ninguém, sem o tal do amor.
O amor existe. Se não existe, o que você me diz das flores murchas que você não joga nunca? Aquelas vermelhas que ele lhe deu no seu aniversário de 40 e poucos anos? É, eu as encontrei dentro de uma caixa velha, junto com outras coisas também velhas e que pra mim não parecem ter sentido, mas que eu sei que se uma daquelas peças cai no chão você cai junto. Se não existe, qual o sentido da humanidade? Da tradição? Das saudades? Qual o sentido das saudades? Aquelas que eu sinto tanto e gostaria às vezes de não sentir. Porque eu passo dias e noites pensando em alguém e por mais que eu tente, por mais que eu me esforce, esse alguém não me sai dos pensamentos? Por que ele me dói tanto? Por que eu sento na janela, me encontro comigo mesma e conversamos sobre ele a noite inteira? Eu não canso. E durante toda essa noite eu tenho a luz só da lua, o vento é gélido de bater os dentes e ainda desalinha o meu cabelo e acredite, nada disso me incomoda. Se o amor não existe como você me diz com tamanha convicção, o que você me diz das lágrimas nos olhos das mães logo quando pegam seus filhos nos braços pela primeira vez? O que você me diz das vezes que você disse para ele ir embora e quando ele foi você jogou a chave pela janela e gritou "Volte, a mesa está pronta e não será desfeita se você não jantar." Você não vivia sem ele, você sabe disso. Então o que você me diz das vezes que você nos colocou dentro do carro dizendo que íamos passar as férias com a vovó e nem sequer saímos da garagem? Você não podia deixá-lo, você não era capaz disso. Então, porque você acha que eu não durmo bem desde que aquele cabeludo que vinha aqui em casa todos os dias e me fazia a moça mais feliz do mundo me disse Adeus? Nos disse Adeus. E também o que você me diz das cartas com tinta borrada de lágrimas que eu nunca enviei? Hein? O que você me diz sobre os abraços intermiváveis que me dava quando eu me machucava na escola? Sobre as vezes que você disse para ele que não o amava mais e quando avistou a decepção e dor nos olhos lânguidos dele, você chorou junto e disse que foi a pior mentira que já lhe tinha contado?
O amor existe, existe a ponto de fazermos loucuras em nome dele, a ponto de aceitarmos todas e quaisquer condições de vida, de diálogo, de abraços, de olhares, contando apenas que estejam bem. Se não existisse, NADA disso faria sentindo ALGUM.
Eu não faria sentido pra você e vice-versa. O amor às vezes parece ser uma farsa, parece ser uma arma de brinquedo que não mata, só machuca e ainda assim, insistimos em amar, estamos presos à isso e não há como mudar a situação. Mas se lhe deixa mais leve ouvir a mentira...]

- É mãe, o amor não existe.

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